Relato de Renata Ribeiro Arruda

“Induzir é para os fortes” – relato de Renata Ribeiro Arruda

Confira o relato de Renata Ribeiro Arruda, paciente da Dra. Juliana Chalupe Amado, do Grupo Nascer, de Curitiba.

 

“A bolsa rompeu às 3 horas da manhã.”

“Eu estava dormindo e comecei a sentir contrações de 5 em 5 minutos.”

“Resolvi sair para comer e comecei a sentir fortes contrações.”

 

Era alguma coisa similar às três primeiras frases que eu imaginei para começar a contar o nascimento de meus filhos. Eu tenho dois, mas simplesmente desconheço o que é entrar em trabalho de parto naturalmente.

Então, a primeira coisa que aprendi até agora sobre partos é que, o que você vê na TV ou a história maravilhosa de uma colega, possivelmente não tenha nada a ver com o que você vai viver. Eu queria muito um ter um parto normal, mas descobri que ‘querer’ não é o único requisito para se ter um.

É por isso que, não consigo falar sobre o parto da Rebeca (minha segunda filha) sem falar de como nasceu o Daniel (meu primogênito).

 

A chegada do Daniel

Daniel nasceu de cesárea quando fiz 41 semanas. Entre os principais motivos para a cirurgia estavam:

  1. Eu não entrei em trabalho de parto, ele não estava encaixado e eu não fazia ideia do que era ter uma contração.
  2. Meu médico da época, um profissional respeitoso e querido, achava perigoso estender a espera para além das 41 semanas.
  3. Eu não havia me preparado para o nascimento ser depois de 41 semanas, os avós já tinham se deslocado de São Paulo para Curitiba para conhecer o neto.

 

Foi então que, contra minha vida vontade, e também por decisão minha, Daniel nasceu de cesárea eletiva às 41 semanas. Foi tudo certo. Minha recuperação foi excelente, apesar da tremedeira decorrente da anestesia. Comecei a descobrir ali que a forma como um bebê vem ao mundo é importante, mas é só um detalhe diante do desafio da maternidade.

 

Grávida novamente!

Quando Daniel tinha 1 ano e 6 meses, engravidei novamente. Foi uma gestação tranquila, mas totalmente diferente. A começar com as varizes vulvares que tornaram a passagem natural da Rebeca um caminho sinuoso.

Apesar da primeira experiência, eu continuava querendo muito um parto normal. Aliás, ainda mais do que antes. Particularmente achei terrível a sensação de ter meu filho anestesiada em uma maca de hospital.

 

Preparação para o parto começou cedo

A preparação para o parto natural da Rebeca começou com umas 15 semanas, com aulas de pilates especiais para gestantes, carinhosamente orientadas pela Tamara Antochecen Baschta. Conheci também muitas outras histórias sobre partos num studio recheado de gestantes desejosas por um parto normal.

Também comecei a procurar uma doula, pois eu não queria perder nada que pudesse me ajudar no tão sonhado parto normal. Felizmente a Patrícia Teixeira foi colocada em meu caminho para me acompanhar. Eu já estava com a melhor médica, Dra. Juliana Chalupe Amado, que queria tanto quanto eu que a Rebeca viesse de parto vaginal.

Eu descobri durante a gestação que, se eu queria de fato um parto normal, eu precisava estar cercada por pessoas que me permitiriam isso, que esperariam comigo até o momento final. Como eu já tenho o melhor marido, não me preocupei – acreditem, tem maridos (e outros parentes) que também atrapalham um parto normal.

 

Onde estão as contrações?

Quando completei  41 semanas de gestação da Rebeca, continuava tentando saber como era sentir uma contração. Eu não sentia absolutamente nada que me indicasse que ela estava quase para nascer. Foi quando começamos a nos preocupar. Embora estivéssemos confiantes, só faríamos uma cesárea se fosse necessária.

É um pouco irritante passar das 40 semanas porque começam a te dar dicas de como acelerar a chegada do trabalho de parto. E, não sei se isso funciona para alguém. O fato é que, para mim, nada funcionava. Para terem uma ideia, após o parto eu tive inflamação num nervo da região lombar de tanto pular na bola de pilates, tentando ativar o trabalho de parto.

Também começaram a me encher de perguntas sobre até quando esperar e blá blá blá. Mas eu já havia me preparado para tudo isso desde o nascimento do Daniel. E eu acreditava que a Rebeca viria entre as 41 e 42 semanas de gestação.

Entretanto, como eu não sentia nenhum indicativo de que entraria em trabalho de parto até 42 semanas, começamos a conversar sobre as alternativas de indução após a cesárea.

Nenhuma delas seria cômoda e, nessa hora, eu pude provar que não era conversa fiada minha essa ideia de ir até o fim para ter um parto.

 

Como parir sem entrar em trabalho de parto?

Foi aí que decidimos que eu faria o descolamento de membrana. Trocando em miúdos: durante um exame de toque, o médico traz o útero para a altura da vagina e abre a passagem manualmente, fazendo que você tenha dilatação para indução.

A Dra. Juliana, que é uma médica humanizada, estava morrendo de dó, mas fez o possível para trazer meu útero para o lugar necessário ao parto normal. Doeu um pouco, mas ok. Entretanto, não foi suficiente para dilatar os 3 centímetros necessários para a indução. Aí ela me passou para outro médico incrível, Dr. Álvaro Silveira Neto, que não sem dó terminou o serviço de descolar meu útero e garantir os 3 centímetros. Dessa vez doeu muito e eu comecei a mensurar o que seria contração ou dor de parto.

Esse procedimento comumente desencadeia o trabalho de parto em até 48 horas. É claro que, não comigo. Eu continuava tentando descobrir se tinha as tais contrações e simplesmente não percebia as mesmas.

Aguardamos até 41 semanas e 5 dias. Não entrei em trabalho de parto. Ok, pelo menos nós já tínhamos preparado meu corpo para a indução com ocitocina sintética. Então, agendamos a indução no Hospital Santa Cruz. Foi um pouco parecido com o do Daniel, não teve surpresas, eu podia fazer as malas e me dirigir ao hospital sem sufoco ou desespero. Foi o que fizemos.

 

Induzir é para os fortes

A indução foi agendada para o período da tarde do dia 5 de dezembro de 2015, era um sábado ensolarado e nossa linda e loira doula já estava nos esperando no hospital quando chegamos. Demos entrada no processo de internamento – tem toda a burocracia relacionada a liberação do plano – esperamos um monte enquanto mandávamos fotos e mensagens no WhatsApp. Não teve aquela emoção de filme em que você sai correndo para o nascimento de seu filho. A espera era entediante, mas meu marido sempre com bom humor: “A Renata está maravilhosamente bem. Estonteante, radiante. Eu, se é que importa, tremendo as pernas”, ele escreveu para a família.

Nossa médica chegou e nos salvou de ficar mais um tanto na sala de espera e fomos para a sala de parto. Eu não sentia nada de dores. Às 17h chegou uma técnica de enfermagem para achar a veia e colocar a ocitocina. As dores começaram ali, pois achar a veia foi difícil.

Estávamos na sala eu, meu marido, a doula e a médica. Meia hora de ocitocina e eu continuava tentando decifrar a tal da contração, mas a Ju e a Paty me ajudavam a perceber. As contrações iam e vinham ainda indolores. Jantei uma sopa fornecida pelo hospital e os acompanhantes foram de pizza. Já havíamos contado sobre infância, desilusões amorosas e muitas outras coisas pessoais. Estávamos entre amigos.

Às 21h, estava com 5 de dilatação. Mais ou menos nesse momento comecei a sentir dor nas contrações. Foi quando fomos para uma sala mais confortável que tinha chuveiro.

 

Parei de raciocinar!

Comecei a sair de mim dançando um sertanejo desconhecido. Umas 23h, quando a dor apertou, me mandaram para o chuveiro para relaxar. Entrei em baixo da água e melhorou. Eu não sei quanto tempo fiquei no chuveiro, mas foi bastante. Logo cheguei naquele ponto em que a contração era quase contínua e quando chegava você só queria que ela acabasse.

Saí do banho, troquei a camisolinha e vomitei a janta. Me perguntaram o que eu queria fazer. Nada. Queria parir, apenas. Foi então que comi umas castanhas e tomei Gatorade pra me hidratar após o vômito. Vomitei de novo. A dor ficou muita intensa, eu já não estava raciocinando direito.

Por sugestão da doula, fiquei de quatro, comecei a sentir uma vontade de empurrar. Fazia força mesmo. A bolsa rompeu. Aguaceira e loucura!

Continuei fazendo força… Todos me apoiavam, mas o efeito era mínimo diante da intensa dor. Ainda na posição de quatro, o Pedro me abraçava tentando me trazer alívio enquanto a Paty massageava minhas costas. Que dor! De repente, lasquei uma mordida no Pedro, era difícil medir as ações.

Considerando os sintomas – dor intensa mais a vontade de empurrar – calculamos que a dilatação deveria estar perto dos 8 centímetros. Foi então que a Ju falou pra eu deitar e fez o toque. 6cm ainda. Ela não soube disfarçar a frustração de não me dar a resposta esperada. Fiquei desorientada. Ia demorar muito ainda e a ocitocina sintética estava mandando dores muito fortes. Eu não sabia o que esperar.

A analgesia

Você sabe que fez a escolha certa quando, incapaz de raciocinar, guiam você para onde você quer ir. Eu queria parir e estava difícil. Mas as duas profissionais responsáveis e amáveis estavam pensando no melhor para mim quando eu já não podia. Elas me disseram para eu tomar analgesia. Eu não era contra, mas também não queria ser anestesiada. Enfim, concordei. Chamaram o anestesista e, não me esqueço que, do momento em que aceitei em diante, cada segundo parecia muito tempo. Eu comecei a reclamar de dor e a Paty tentava me acalmar:

– Tá demorando – eu dizia.

– O anestesista está vindo – ela me disse.

É nítida ainda em minha lembrança de um abraço desesperado que dei nela ao som de: “Fala pra ele vir logo – buáaaaaaa”.

Tomei anestesia. Como explicar o que é anestesia nesse momento? É algo mágico, talvez dos sentimentos mais reconfortantes que já tive. Eu estava desesperada e tive paz, tive alívio. E que alívio.

 

Dormi!

Às 2h da manhã eu dormi, como quem não tem nada para fazer. Já ouvi casos de muitas mulheres que dormem durante o trabalho de parto. Mas era difícil de me imaginar nessa situação. Ainda mais eu, toda agitada.

Enquanto isso, meio em secreto no corredor do hospital, Dra. Ju confessava ao Pedro que, caso minha dilatação não prosseguisse, corríamos o risco de precisar da cesárea.

Dormi pouco mais que uma hora. Acordei e que surpresa boa: relaxada eu tinha dilatado até os 9 centímetros. Nós estávamos cansados, mas a animação tinha retornado. Ufa!

 

A dor volta e rouba a lucidez

Fui direcionada para conseguir fazer força nas contrações, já que não estava sentindo muita coisa. Eu estava empenhada e me juraram que eu era boa em fazer força. Eu estava quase me orgulhando quando o efeito da anestesia começou a passar. E doutora começou a me sugerir posições para a Rebeca se arranjar melhor na saída.

A dor voltou e roubou minha lucidez. Eu não conseguia pensar muito, apenas seguia as ordens. Algumas vezes achava as considerações irritantes. Afinal, você está com uma dor terrível e te pedem paciência porque sua filha já está chegando. “Sacooooo, não dá para ela chegar logo”. Entretanto, a dor não gera em mim impulsividade, mas passividade. Eu não tinha forças para grosseiras, e apenas choramingava insatisfação: “Eu só quero que ela venha logo”.

Dos 9 para os 10 centímetros de dilatação foram mais de 1h30. Minha médica disse: “Está quase nascendo, difícil, mas tá”. Ela é da família, então estava no grupo compartilhando o progresso do parto.

Quando chegou o ‘finalmente’, eu não sabia mais o que estava fazendo, às vezes faltava força, mas eu empurrava mesmo assim. As varizes vulvares deslocavam a cabeça da Rebeca para as proximidades do ânus. Dra. Ju começou a ficar preocupada. Lembro dela dizer: se não nascer em 3 forças vou fazer epsiotomia. Não precisou. Nasceu. Rasgando tudo. Às 5h14.

 

 

Se eu pari, qualquer mulher também consegue

Após o nascimento da Rebeca por parto vaginal, eu costumo brincar que: se eu pari, qualquer mulher também consegue. A verdade é que nem sempre é possível um parto normal, e felizmente a cesárea é muito importante para salvar a vida de mães e bebês em complicações. se você quiser mesmo, e tiver um médico que não vai te encaminhar para uma cirurgia desnecessária, é muito provável que você consiga fazer um parto normal.

O que eu também pude avaliar após o nascimento da Rebeca é que, definitivamente, eu não sou daquelas mulheres parideiras, em que parir é dolorido, mas natural. Por isso, para mim, foi tão importante querer muito – e ter a médica mais queridinha do Brasil – para conseguir fazer a Rebeca vir sem precisar ser cortada.

 

O pós-parto

Eu finalmente tinha alcançado o esperado nascimento de um filho por parto vaginal. O Pedro estava eufórico, com uma felicidade notável. É só olhar as fotos. Eu também estaria se tivesse passado por tudo sem sentir a dor.

O fato é que a Rebeca nasceu e, se realmente existe a partolândia, era lá que eu estava ainda, mesmo ela já tendo nascido. Demorei uns minutos para voltar. Me entregaram a Rebeca para eu tentar dar de mamar, eu achava tão mágico essa história de o bebê nascer e já mamar no peito. Mas na realidade não foi assim, ela não pegou o peito, parecia que estava cansada de contrair, eu estava como ela e não fiz questão nenhuma de que ela mamasse naquele instante. Ela teria seis meses para quase só fazer isso.

Não foi feita a episio, e aí eu pergunto se o rasgo que as varizes causaram não seria o mesmo que uma episiotomia. Fiquei com uma coceira agonizante por uma semana e com dor na relação por meses. Também tive uma queda de pressão inexplicável, já que não tinha perdido muito sangue, que me fez ficar na cama do hospital sem poder tomar banho por umas 12 horas.

É verdade que eu subi e desci as escadas de casa sem preocupações desde a chegada da maternidade, e também peguei o Daniel (de 2 anos) no colo sempre que quis. Em outros aspectos, porém, considerei minha recuperação pós-cesárea melhor que do parto. Desculpem as naturalistas, mas é verdade.

Assim, se eu tiver outro filho e puder escolher, ainda fico com parto vaginal, vou esperar até as 42 semanas por ele, mas não sei se vou induzir tanto assim.

De qualquer forma, continuo indignada com as cesáreas eletivas por volta das 38 semanas, mas entendo quem tem medo de parto. O fato é que, depois que o bebê é gerado, não vai sair sem sacrifício. Mas se eu puder dar uma dica às gestantes: espere seu filho estar pronto e ao sinal de que está na hora, venha como vier.

 

  

 

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