Síndrome de Down

A Síndrome de Down e a gestação

Um dossiê completo sobre gravidez e primeiros cuidados. Com informações de Mônica Brandão | Bebê Abril

A Síndrome de Down se trata de uma alteração genética que ocorre quando o feto está sendo formado. Uma célula humana considerada normal possui 46 cromossomos, divididos em 23 pares. Por alguma razão desconhecida, pode ocorrer um erro no começo do desenvolvimento embrionário e é criado um cromossomo extra, que fica ligado ao par 21. O resultado são células com 47 cromossomos. Isso causa a referida síndrome. A falha na formação pode ocorrer de três formas, chamadas de trissomia 21 padrão, translocação e mosaico. Acontecer de uma maneira ou de outra não muda as características da criança. Não existem graus de Síndrome de Down, mas, por causa de sua herança genética, educação e meio ambiente as crianças podem se desenvolver de formas diferentes.

É importante saber que essa falha acontece ao acaso. A responsabilidade não é de ninguém. Não foi provado até hoje que estilo de vida, ações durante a gestação, fumo, bebidas, medicamentos, fatores ambientais ou parentesco entre o casal possam influenciar essa ocorrência. Ela também não é contagiosa. A probabilidade de alguém ter a síndrome é de aproximadamente 1 para 600 nascimentos. No Brasil, cerca de 300 mil pessoas nascem com Down a cada ano.

O que significa ter um bebê diagnosticado com Síndrome de Down?

Significa que ele vai nascer com algumas características específicas, como os típicos olhos amendoados com uma caída de pálpebra mais acentuada, uma prega única na palma das mãos, língua que tende a ficar fora da boca (língua protusa) e hipotonia (flacidez muscular). Essas duas últimas características, que podem interferir no desenvolvimento da criança, são controladas com a ajuda de fonoaudiólogos e fisioterapeutas. A síndrome pode resultar em certo comprometimento intelectual, que não a impedirá de desenvolver-se como qualquer outra criança se receber muita estimulação, interações de qualidade e amor. Atualmente, com os avanços da medicina e novas pesquisas, uma criança com Síndrome de Down pode ter uma vida e um desenvolvimento semelhantes ao de crianças sem deficiência. Como qualquer ser humano, ela vai desenvolver suas potencialidades e limitações.

A síndrome não é considerada uma doença, mas existem algumas complicações que um Down pode apresentar com mais frequência que outra criança, como má formação cardíaca e do intestino, baixa imunidade, problemas de visão, de audição, respiratórios e odontológicos. Enquanto certas crianças nascem com algumas delas, outras não terão nenhuma.

 

Quais as chances de eu ter um filho com Síndrome de Down?

A síndrome pode acontecer em qualquer família, independentemente de sua raça, credo ou condição social. Após vários estudos, os especialistas acreditam que a idade dos genitores, principalmente a da mãe, poderia aumentar as chances do problema ocorrer. Aos 30 anos, o risco de uma mulher ter um bebê Down é de 1 em mil. Aos 40 anos, é de 1 em 100. Imagina-se que a idade dos óvulos interfira na divisão embrionária, mas o assunto ainda é muito polêmico, pois mulheres jovens também concebem bebês com a síndrome. Alguns estudos relacionaram a idade dos homens ao problema, mas não se chegou a nenhuma conclusão. No Brasil, os obstetras costumam investigar com maior atenção mulheres acima de 35 anos.

Quando o casal já possui um filho com Down e quer outra gravidez, é aconselhável investigar se a falha genética ocorreu por translocação. A translocação pode acontecer ao acaso, mas, em 50% das vezes, a causa é uma alteração cromossômica em um dos pais. Essa alteração não chega a ser a trissomia 21, não apresenta implicações físicas ou mentais, mas quem as possui tem maior probabilidade de ter filhos com Down.

 

Exames durante a gestação

Os exames de ultrassom podem dar algumas pistas, já que os fetos com Down possuem certos sinais físicos. Por exemplo: quinto dedo da mão e braços menores, pescoço e nariz mais curtos. Existe também, feita por volta da 12ª semana de gestação, a medida da translucência nucal, uma prega na região de trás da cabeça, cujo tamanho excessivo pode indicar problemas. Quando o médico desconfia de algo, pode seguir com a investigação, pedindo um exame de sangue mais detalhado, que irá analisar a alfafetoproteína no sangue da grávida. Baixos níveis dessa substância costumam estar relacionados a alterações cromossômicas. Com todos esses dados, o obstetra e o casal vão avaliar se é necessário um exame invasivo e definitivo, que analisará o cariótipo do feto.

Existem três tipos de exames invasivos para colher material genético e o casal, com o médico, pode escolher o melhor para o seu caso. Na Biópsia do Vilo Corial, uma amostra de tecido da placenta é retirada, via vaginal ou pelo abdômen, para ser analisada. Ela pode ser feita entre a 8ª e a 11ª semana de gravidez. A mais popular é a amniocêntese. Nela um pouco do líquido amniótico é retirado por meio de uma agulha inserida no abdômen. Costuma ser realizada entre a 14ª e a 17ª semana. Por último, há a cordocêntese, quando é retirada uma amostra do sangue do cordão umbilical após a 24ª semana. Os exames invasivos são feitos em último caso, uma vez que há de 0,5 a 2% de risco de aborto.

A grande vantagem é ter a chance de se preparar para o acontecimento. Primeiro porque há muita desinformação sobre a Síndrome de Down, até mesmo entre os médicos, e você e seu companheiro poderão pesquisar mais sobre o assunto. Existem vários grupos de apoio, físicos e virtuais, que formarão uma rede importante de amigos, e outros pais com filhos Down que irão ajudar a desmitificar o que é a síndrome. Livros, sites, blogs e filmes darão a possibilidade de aprender mais sobre esse bebê e descobrir suas potencialidades. Vocês poderão lidar com as angústias, as incertezas e os medos em momentos que não coincidem com o parto e os caóticos primeiros dias de um bebê em casa. Ganharão tempo de se organizar, trocar emoções e se posicionar perante parentes e amigos.

Outra grande vantagem é que o obstetra também se prepara para ter mais controle sobre o parto e os primeiros cuidados com o bebê. Ele já saberá, por exemplo, que é necessário ter um cardiologista de plantão no caso de o recém-nascido apresentar alguma cardiopatia — e essa simples atitude pode minimizar vários problemas futuros.

 

A dificuldade da descoberta

Ouvir esse tipo de diagnóstico é um choque e é necessário um período para assimilar a notícia. Seu primeiro pensamento possivelmente será a de que os médicos estão errados. Pode também surgir culpa, achando que seu corpo é o responsável pelo problema. Mais uma vez, a melhor maneira de lidar com isso é buscar ajuda em grupos de apoio. Você pode começar pela internet, na qual não precisa se identificar se não quiser. Ao ver as histórias de outros pais, conhecer outros bebês e entender melhor o que é a síndrome, ficará mais tranquila quanto ao que lhe espera. Não exija uma aceitação rápida sua ou de seu companheiro. Cada pessoa tem o seu método e o seu tempo para administrar o luto, entender e aceitar mudanças. E é mais ou menos isto que vocês irão passar: um luto pelo bebê que esperavam e a assimilação das mudanças que o novo bebê trará. Acredite que ver seu filho depois do parto a fará aceitar melhor a situação. Pois ele será tão apaixonante, tão seu e tão amoroso que muitos desses sentimentos poderão se modificar.

Caso o seu obstetra seja de confiança, ele mesmo pode continuar cuidando de sua gestação, usando a experiência que tenha no assunto ou se atualizando. Ou procure um profissional que lhe passe segurança e tenha acompanhado esse tipo de gravidez antes. Bebês com Síndrome de Down geralmente têm partos prematuros e podem nascer com algumas complicações, que rapidamente resolvidas não deixam sequelas. Por isso, a maternidade que você escolher deve ter bons recursos, uma boa equipe de neonatologistas, de preferência com experiência em nascimentos de Down, uma UTI neonatal caso a prematuridade do bebê exija. E também cardiologistas, fisioterapeutas e fonoaudiólogos de plantão. Seu obstetra ou os participantes dos grupos de apoio podem indicar as melhores. Converse também com outros pais para comparar os hospitais.

 

Gestação de um bebê com Síndrome de Down é considerada de risco?

A gravidez não oferece risco, mas precisa ser monitorada mais de perto para investigar qual o estado de saúde do bebê ao nascer e para que eventuais problemas sejam detectados o mais cedo possível. Quanto mais o obstetra souber e mais preparado estiver, melhor para o bebê, que poderá ter os cuidados necessários assim que nascer. Por isso, dependendo do desenvolvimento do feto, serão necessários mais ultrassons, mais exames de ecocardiograma e avaliações de outros especialistas, como cardiologistas e cirurgiões pediátricos. O conhecimento da síndrome também gera conflitos pessoais e na família, o que aumenta o estresse da gestante. Por isso, em alguns casos, o obstetra também sugere apoio psicológico ou psiquiátrico para ajudar a grávida a lidar melhor com a situação.

 

Bebês diagnosticados com Síndrome de Down durante a gravidez podem nascer de parto normal?

O final da gravidez e o trabalho de parto serão feitos da mesma maneira, mas sempre com uma monitoração mais atenta para acompanhar a evolução de possíveis problemas já diagnosticados no bebê. A síndrome e mesmo a presença de cardiopatia fetal não são indicações para cesáreas, mas muitas vezes, dependendo do estado do bebê e pelo parto envolver certo planejamento e uma equipe multidisciplinar (obstetra, neonatologista, cardiologista), pais e médicos preferem marcar uma cesárea para ter mais controle sobre a situação.

Há maior risco de parto prematuro?

Sim. Entre os fatores de risco associados à prematuridade, estão o estresse materno e as malformações fetais, os dois presentes em casos em que a Síndrome de Down é diagnosticada. Um bom obstetra estará atento ao fato e irá preparar os pais, dando apoio médico e psicológico no pré-natal para que a gestação tenha a chance de ir o mais longe possível. Nem todos os bebês que nascem prematuros precisam ir para a UTI Neonatal. Dependendo do seu estado de saúde ao nascer, ele pode ser monitorado no próprio berçário e ir para casa com os pais.

 

Como reconhecer a Síndrome no nascimento, caso não tenha sido diagnosticada anteriormente?

O obstetra pode levantar a hipótese da existência da Síndrome de Down ao ver a face do bebê assim que ele nasce. Mas nem todos apresentam alterações reconhecíveis nesse primeiro momento. O pediatra que examinará o bebê em seguida para o teste de Apgar tem mais chances de notar algo, mas o teste em si não aponta nada — muitos bebês com Down têm boas notas. É mais provável que as desconfianças apareçam nas primeiras horas no berçário, quando o bebê é observado com mais calma. Caso existam muitas evidências da síndrome, o obstetra ou o pediatra irá conversar com os pais. O próximo passo é fazer um exame do cariótipo do bebê que irá analisar seus cromossomos e dizer com exatidão se a síndrome está presente ou não. O resultado pode demorar até duas semanas para sair, o que geralmente causa certa ansiedade. Mas raramente os médicos erram em suas primeiras avaliações.

Casais que ficam sabendo da síndrome logo depois do parto passam pelo choque, sentimento de negação e culpa, e precisam de um tempo para assimilar a notícia. Quem se preparou durante a gravidez estará mais calmo para lidar com a realidade do novo bebê. Mesmo assim, é possível que vários sentimentos iniciais voltem a tona. O melhor é descansar e, assim que estiver liberado, curtir o bebê. Ao pegá-lo no colo, amamentá-lo, passar um tempo com ele, você ficará mais tranquila para compreender a novidade. Conforme o bebê responde aos estímulos, sorri e interage, isso vai ajudar a família a administrar a situação. É preciso entender que ele será um bebê tão fofo quanto os outros e dará muito prazer com suas conquistas. Mesmo que os sentimentos sejam confusos e alternados, se dê o direito de curtir seu novo papel de mãe. Vista seu filho com as roupinhas que escolheu para esses dias, mime-o, coloque o enfeite na porta do quarto, distribua as lembrancinhas para as visitas.

 

O bebê precisa de cuidados adicionais logo após o nascimento?

Depende de como ele nascer. A Síndrome de Down pode estar associada a outras complicações, como cardiopatia, problemas neurológicos, metabólicos, de audição ou visão. Nas primeiras horas no berçário, são feitos vários exames e testes, como o do pezinho, da orelhinha, oftalmológicos e físicos, para verificar se o bebê tem algo, se precisa de uma intervenção de urgência — como uma operação cardíaca — ou apenas um tratamento. Ele passará pela avaliação de um fonoaudiólogo, que ajudará nas primeiras mamadas, e um fisioterapeuta, que analisará sua hipotonia, além de ensinar aos pais como exercitar seu bebê para que ela diminua. É aconselhável uma visita ao pediatra assim que o bebê sair da maternidade para que ele o acompanhe desde cedo e oriente os próximos passos.

Voce sairá da maternidade com algumas recomendações específicas que dependem das condições do seu bebê. E o pediatra também dará orientações. Uma boa ideia é procurar um Programa de Intervenção Precoce, que irá ajudar no desenvolvimento do seu filho — o próprio hospital, pediatra ou grupos de apoios podem sugerir um. Quanto mais cedo começam os cuidados, mais o bebê terá chances de se desenvolver como os colegas de berçário. Por exemplo: o Down costuma nascer com uma protrusão da língua que mantém a boca aberta durante o tempo todo. Por isso, ele baba e pode ter dificuldade para mamar, comer e falar. Com a ajuda de um fonoaudiólogo, será treinado para conseguir tudo isso. A hipotonia também será trabalhada por um fisioterapeuta para que o bebê firme sua coluna, sente e ande normalmente. Esses profissionais irão ensinar as atividades para que toda a família participe e ajude a criança a se desenvolver melhor.

Lembre-se de estar atenta à visão e à audição do bebê. Muitas vezes, dificuldades na hora de andar e estudar têm a ver com o fato de a criança não ouvir ou ver corretamente e não necessariamente com problemas físicos ou neurológicos. Quando os pais não têm a iniciativa de procurar ajuda, correm o risco de prejudicar o desenvolvimento do filho. Uma das consequências da Síndrome de Down é certo comprometimento intelectual e, para que se desenvolva toda a potencialidade da criança, o ideal é começar cedo.

 

Devo amamentar meu filho com Síndrome de Down?

Claro! A amamentação é ótima para o bebê com Down. O leite materno ajuda a criar anticorpos e desenvolver sua imunidade. Ele diminui o risco de infecções, muito comuns em quem tem a síndrome. O ato de sugar o peito da mãe é difícil para esse bebê, mas o ajudará a preparar sua musculatura para mais tarde mastigar e falar. A equipe da maternidade dará orientações de como ajudar o bebê a pegar o peito e sugar de forma correta. Como acontece geralmente em todas as famílias, o primeiro mês pode ser mais difícil, pois ele e você estão se adaptando. Não desista! Procure ajuda nos grupos de apoio se necessário.

 

Como são os primeiros dias da criança com a Síndrome?

Os primeiros dias do bebê em casa são muito parecidos com os de qualquer bebê. Tudo parece muito caótico, uma vez que todos estão se adaptando a nova realidade — os novos papéis de mãe e pai, ter um novo filho e irmão etc. No caso do Down, isso pode significar mais idas aos médicos e certos cuidados específicos, dependendo de como ele nasceu. Como ocorre em qualquer família, quanto mais os pais estiverem tranquilos, mais fácil será. E quanto mais preparados, melhor. Isso significa ter tudo certo com o quarto do bebê e seu enxoval (lembre-se das fraldas!), apoio para o cotidiano doméstico da casa, ter um bom pediatra a mão e, se necessário, outros especialistas.

Converse com outros pais para descobrir o que foi legal para eles e que você pode aproveitar. Existem famílias que gostam de ficar totalmente sozinhas curtindo o bebê enquanto outras colocam os parentes para morar na casa durante o primeiro mês. Descubra o que lhe fará mais feliz.

Não deixe que ninguém tire a alegria e o brilho desse momento em sua vida, mesmo que ele esteja acontecendo de forma diferente do esperado. A criança com Down aprenderá tudo, mas no seu tempo. Quanto mais estímulos e interações ela tiver, melhor. Trate seu bebê normalmente, sem restrições por ele ter uma síndrome. Mostre brinquedos coloridos, cante para ele, deixe outras pessoas interagirem. E apresente-lhe o mundo. Com o tempo, ele descobrirá as cores, as formas, as texturas, os sons, os cheiros. Deixe-o viver e o acompanhe!

Fontes:

  • Ana Claudia Brandão, pediatra e coordenadora do Centro Integrado de Atendimento a Criança e ao Adolescente com Síndrome de Down do Hospital e Maternidade Albert Einstein, em São Paulo.
  • Ana Merzel, psicóloga do Hospital e Maternidade Albert Einstein.
  • Ana Paula Junqueira Santiago, ginecologista e obstetra, especialista em Pré-Natal de Alto Risco, do Hospital São Camilo, em São Paulo.
  • Cristina Valente, consultora parental
  • Eduardo Vieira da Motta, ginecologista e obstetra do Hospital e Maternidade Albert Einstein.
  • Guacyara Labonia Guerreiro, coordenadora-geral adjunta da ONG Mais Diferenças – Educação e Inclusão Social.
  • Médico Hamilton Robledo, pediatra do Hospital São Camilo.
  • Médico Zan Mustacchi, pediatra especializado em crianças com Síndrome de Down e diretor da CEPEC – Centro de Estudos e Pesquisas Clínicas de São Paulo.

 

Imagem: Getty Images.

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